"Cuidado com o santo que o andor é de barro!” Essa foi uma expressão que me fez lembrar Edmund Husserl (1859-1937), um dos filósofos mais importantes do século XIX. Ele é responsável pelo que hoje conhecemos como "Fenomenologia"' – corrente filosófica que reflete a velha celeuma da relação sujeito versus objeto! Uma de suas teses mais importantes, e que nos interessa, é a da “intencionalidade da consciência”. Para ele, a consciência é sempre “consciência de”, portanto, há sempre uma “intenção”. Suas contribuições ultrapassaram as muralhas acadêmicas e atingiram os sábios cérebros medievais da hierarquia eclesiástica. Nesse sentido, não só a filosofia ganhou novos argumentos, mas também a velha teologia mercantilista sobrevivente do último empreendimento conciliar. Esta velha carola ratifica a tese de que Fides et Ratio estão sempre juntas como as asas da águia, ganhando mais vôo à medida que surgem mais argumentos "filo-teológicos". Não quero com isso dizer que Husserl seja um teólogo, nem que os teólogos são filósofos, essa discussão deixo para os interessados no assunto. O que venho ressaltar é sobre a astúcia da Mater Ecclesiae: primeira instituição a praticar a globalização, não deixa de exibir suas afinidades com o capitalismo, como já evidenciava Max Weber em A ética protestante e o espírito do capitalismo – e é claro que a diferença entre católicos e protestantes está na disputa se o santo é de barro ou se o barro é santo!
Sim, e aí? O que tem a ver Husserl, a Igreja e Weber? Ah, lembrei! É que ontem fui à missa, fazia um mês que minha prima faleceu. A missa é uma oração, e se se ora, se ora por alguma causa, portanto, há uma “intenção” na oração, ou seja, na missa. Pois bem, mas alguém preside essa oração, essa missa, e sua presidência administra as “intenções” pelas quais se ora! Velha novidade: e a taxa de administração das santas “intenções”? Aí, redescobrir que para cada “intenção” se cobra uma taxa de mais ou menos dez reais. Bem, mas se você quiser que a missa seja só para sua “intenção”, aí é mais caro, custa, em média, setenta reais. Pelo que percebi, o que importa é a quantidade de “intenções” ou sua exclusividade, não sei nada sobre o critério de qualidade, ou seja, se há diferença no custo entre a boa e a má “intenção”, o que sei que importa é se é 1, 2, 3 ou única intenção; também não sei se os dizimistas têm algum desconto de 10%, se podem parcelar no cartão de crédito ou no cheque especial, mas certamente eles têm intenções!
Quando o homem descobriu que o avião serviria para guerra, Santos-Dumont ficara decepcionado. Será que Husserl ficaria decepcionado se soubesse que as “intenções” viraram mercadoria? Bem, isso não me interessa muito! Agora, se Lula, na falta da CPMF, descobrir que intenções valem de dez a setenta reais, ah, isso me interessa, porque de boas intenções o inferno está cheio!
1 de fevereiro de 2008, 22:06:21
Josemar, com más intenções!