sexta-feira, 28 de março de 2008

(IN)DIFERENÇA

"O sol nasce para todos!" Presente em tantas vozes, essa expressão faz de todos nós desprovidos de culpas pelas variadas desigualdades humanas, sejam elas representadas pelas dimensões social, política ou étnica. E se o sol brilha para todos, ele, como representante do Bem platônico, não faz distinção entre os homens, pois entende que todos são iguais, portanto, julga ser bom e necessário brilhar para todos. Mas como bom contemporâneo, percebo que o sol platônico não passa de uma metáfora, demasiadamente, fictícia, portanto, demasiadamente irreal, ou, ironizando, surreal! Não usando de antropomorfismos, penso que o sol é APENAS E TÃO SOMENTE uma estrela de, chamamos, quinta grandeza, assim, ele brilha intensamente, e sua função é estritamente esta: de brilhar e aquecer! O sol é desprovido ABSOLUTAMENTE de consciência e de qualquer possibilidade de agir a partir desta... Desse modo, apesar de nosso desejo de fazer da tão sonhada democracia um instrumento para possibilitar e garantir a igualdade de direitos entre os gêneros, as raças e as classes, o sol continuará brilhando para todos, PORÉM, o seu brilho e seu calor serão sentidos de formas diferentes, e cada um de nós, em seu tempo e em seu espaço, terá as reais e angustiantes percepção e consciência de que somos, essencialmente, condenados a sermos “diferenças”!
18 de março de 2008, 19:30hs
Josemar Silva

quarta-feira, 26 de março de 2008

SoCOrrO

"Socorro! Não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar
Nem pra rir...
Socorro! Alguma alma Mesmo que penada
Me empreste suas penas


Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada...

Socorro! Alguém me dê um coração
Que esse já não bate Nem apanha
Por favor! Uma emoção pequena Qualquer coisa!
Qualquer coisa Que se sinta...
Tem tantos sentimentos Deve ter algum que sirva...
Socorro! Alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento
Acostamento, encruzilhada



Socorro! Eu já não sinto nada...
Socorro! Não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Nem vontade de chorar Nem de rir...
Socorro! Alguma alma Mesmo que penada Me empreste suas penas
Já não sinto amor, nem dor Já não sinto nada...
Socorro! Alguém me dê um coração Que esse já não bate Nem apanha
Por favor!
Uma emoção pequena Qualquer coisa!
Qualquer coisa Que se sinta...
Tem tantos sentimentos Deve ter algum que sirva
Qualquer coisa Que se sinta
Tem tantos sentimentos Deve ter algum que sirva..."



ArNalDO AnTUneS

terça-feira, 25 de março de 2008

O papel do Valor e o valor do Papel

Todos nós acreditamos no valor. Uns acreditam que o valor tem sua historicidade, outros, porém, acreditam no valor como uma essencialidade necessária. Mas tanto uns quanto outros acreditam na existência e eficácia do valor para a ordem e coesão social. Trata-se de valor moral e material, um e outro estão intrínsecos entre si. Todos nós, assim, vemos claramente o papel que o valor exerce na vida individual e social.
É certo que cada indivíduo e grupo social acreditam em certos valores, ora dando ênfase em valores estritamente morais ora privilegiando o valor em termos materiais. Em cada ação individual ou social é visível a presença do valor, seja nas conversas coloquiais ou em grandes discursos. A todo o momento estamos julgando as coisas ou situações, e é claro que tudo isso, indireta ou diretamente, é direcionado por nossas tábuas de valores.
Vejamos quando nos encontramos na conversa com amigos ou outros. Dizemos o que julgamos certo ou errado, belo ou feio, verdadeiro ou mentiroso, dizemos ainda o que achamos caro ou baratos, e às vezes ditamos o preço do carro, da roupa, da comida, etc., até chegarmos ao momento onde uma certa tautologia é verificada quando empregamos o preço do próprio capital ao dizermos a cotação da moeda tal e tal.
O valor, portanto, está em todas as partes e como que definindo todas elas. Conseqüentemente, verifica-se que o valor tem sido nosso grande norte, e que com sua falta tudo se perde, nada parece ter sentido, tudo se apresenta descontrolado e os sentimentos de desespero ou angústia se fazem presentes em todos os indivíduos. O valor se tornou tão essencial que mesmo seus críticos não viveram ou não vivem sem um momento de valoração, de julgamento, pois mesmo suas críticas partem de outros critérios que, no final das contas, são também valores. O papel do valor é, sem dúvidas, oferecer, doar sentido à existência, seja esta a minha ou a nossa.
Parece-nos, então, que é longa e antiga a história do valor. Pois ele nasce, ao nosso ver, com o nascer da unidade entre dois indivíduos, quando, enfim, nasce o grupo social. E desde quando existe grupo social? Ao que nos parece isso é tão antigo que nem sabemos, não há data exata nem suposta, o que temos é uma outra história: a da vida social. Descortinar a história da vida social é labor infinito, onde nem sabemos por onde começar, no indivíduo ou no grupo.
Ao longo dessas histórias é possível verificar o quanto o valor diversificou sua forma de ser eficaz, mas também se verificou sua resistência quanto ao seu objetivo. Doar sentido à existência sempre foi seu efetivar-se, e suas formas foram e são as condições de possibilidade mais enraizadas e constitutivas de identidade que houve e que há. Assim, do papel do Valor é possível falar do valor do Papel.
Do mesmo modo, e mais concretamente, temos o papel. Não queremos aqui falar do papel enquanto função ou modo de exercício de algo ou de alguém – no caso aqui o valor. Queremos mesmo é falar do papel feito ou constituído da celulose. Sim, disto mesmo, da celulose, desta substância das células vegetais de onde é possível fabricar nosso tão necessário papel: papel de escrever, papel de jornal, papel para embrulhar, papel que é dinheiro, cédula.
É! Se falamos acima que em tudo o valor exerce seu feitiço, no papel ele também o faz. O papel de celulose tem seu valor. é claro que cada um expressa um valor, depende de suas funções. Devido à escrita, certos papéis têm seu valor; devido ao jornal, temos novos valores; dependendo do embrulho há um outro valor; porém se se trata de dinheiro, ah!, aí sim, o valor é mais expressivo. Mesmo que este papel de dinheiro seja sujo, feio, rasgado, riscado, mesmo assim seu valor não muda, ele, o valor, é tão fixo nesse caso que ele é capaz de transcender todos os aspectos reais do dinheiro feito de papel sujo, feio, rasgado e riscado.
Esse dinheiro feito de papel (...) compra o papel branco e limpo para a escrita, compra o jornal e compra o papel para embrulho. A virtualidade do valor é tão real que fez do papel nosso guia. Qualquer papel encontrado, comprado, doado, recebido ou mesmo fabricado que tenha simples figuras de animais, de números, de pessoas, letras, com a frase “Deus seja louvado”, podemos ter a certeza que esse papel é de maior valia. É ele, hoje, a grande e eficaz expressão do valor, do que vale e do que é válido.
Para que alguém seja gerado, seja alimentado, nasça, cresça e apareça o papel-dinheiro é indispensável. Nossa vida, toda ela, é marcada pela presença do papel-dinheiro. É mais fácil ser ausente de nossas vidas os nossos genitores, parentes outros, amigos, escola, Deus ou quaisquer outras coisas que se julguem necessárias, porém o papel-dinheiro não, ele é, para nós homens e mulheres modernos, nosso grande sentido, nosso grande objetivo, nosso grande valor.
Como nosso grande valor? Mas quem veio primeiro o valor ou o papel-dinheiro? Quem exerce poder sobre quem? Parece que tanto faz! O que sabemos é que hoje nosso valor é mesmo este, o papel-dinheiro. E vigora ainda o velho jargão popular que diz que “vale-se pelo que se tem e não pelo que se é”, principalmente num tempo onde esse “é” se faz tão flexível e tão móvel que “ser” não faz mais sentido. E assim, o valor impresso no papel fez do papel nosso grande valor!
Viva a capital moral capital!!
10‎ de ‎novembro‎ de ‎2005, ‏‎19:05:25
Josemar Silva

segunda-feira, 24 de março de 2008

Gota Transbordante



Compartilhado com o amigo GeorgeLiberdade: ou a tenho ou sou medroso; ou sou livre ou deveria ser livre. Constatei que por muitas circunstâncias não sou livre. Seja porque falo por minha não-linguagem, seja pelas minhas tantas experiências, seja pelos tantos afetos que adquiri, tenho ou adquiro, ou seja, pela minha própria condição existencial: de fragilidade, de contingência, do não-saber, enfim, da minha finitude a das minhas impossibilidades. Não sou um ser ex-plicado. Todas as im-plicações que circunstancialisam minha vida me tornam cada vez mais não-livre. E cada experiência nova que faço revela-me, por não saber de suas emergências, como ser implicante e implicador, e, por isso, um ser desejoso de liberdade. Não sei ao certo se essa liberdade que desejo já existiu, se ela faz parte de meu destino ou se simplesmente a desejo como a contradição da minha existência. Nem sei se há uma possibilidade de liberdade. Nem sei mesmo no que quero ser livre, e nem sei se esse desejo de ser livre não se confunde com a vontade de fazer alguma coisa proibida. Não sei ao certo se liberdade é fazer o que quero, ou se liberdade é ser o quero fazer. Ser o fazer é grandioso na existência de quem vive de fato. Ser o que se faz é ao mesmo tempo fazer-se. Não quero dizer que sou um ser em construção na medida que faço-me, pois não tenho pretensão de ser um acabado, porém, revelo-me como ser que, na sua contingência, sabe-se inacabado e sempre ativo, portanto, efetivando-se atualmente. Assim, acho que ser livre é, sobretudo, um realizar-se como ser em plena efetivação, sempre diferente, por isso sempre atual. Mas a vida social, ou seja, o “mal-estar”, exige de mim uma atitude, assim como viver e ser livre são atitudes. Mas para cada atitude consciente faz-se necessário aquilo que Sócrates chamara de virtude: a coragem. No “mal-estar” é sempre necessário se ter coragem. Ela é a única possibilidade para o desconforto de escolher viver no bem-estar. Mas entre o desconforto do “mal-estar” para o desconforto do bem-estar parece melhor este. Ele é meu, aliás, ele sou eu, pois no desconforto de não saber quem sou sinto-me feliz por não mais viver quem não sou. No “mal-estar” eu não sou, e se no bem-estar também não sou, mas sei que neste não sou. E a questão não é do saber ou do não-saber, mas é que no saber tenho a plena possibilidade de ser o fazer-se. Preciso de uma gota de coragem! Preciso de uma gota de coragem para que eu possa transbordar, como um mar, de liberdade. Só me falta uma gota de liberdade para fazer-me nascentes e rios, mares e oceanos, fazendo-me mistério para mim mesmo; não quero ser sagrado, quero ser mistério. Quero que a esquina de meu olhar sempre se afirme nessa impossibilidade de me vê todo. Que meu todo não exista, pois seria muito infeliz se um dia eu me encontrasse acabado, pronto para qualquer dissecamento, saciado em todo efetivar-me. Que a infinitude da minha efetividade, da minha atividade, de minha liberdade seja sempre a realidade mutante da minha existência. Que caia a gota que me falta!
‎8‎ de ‎agosto‎ de ‎2003, ‏‎09:34:43
Josemar Silva

Ao Desejo



“Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo.
Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece,
Onde tudo nos mente e nos separa.”(
Sophia de Mello Breyner)


A paixão assola meu ser e atormenta minha alma
Alimenta, incansavelmente, um desejo intenso, violento
Dono de si, impiedoso, cruel e insistente.

Desejo não mais desejado por mim,
Mas em mim se faz a si mesmo,
Sem licença, sem compaixão de mim,
Como se eu fosse um mendigo,
Um andarilho sem origem ou destino.
Faz de mim um marinheiro sem cais, sem barco, sem nada.

Desejo que persiste em viver da contemplação, do olhar,
Da indiferença, da alienação.
Faz de mim um escravo sem forças, sem pulso.
Arrasado na força do desejo não mais meu,
Um desejo alheio aos meus mais novos desejos.

Oh desejo impiedoso,
Levanta-te de mim e prossegue teu destino só.
Dar meu lugar a mim,
Deixa-me ser.
Permita-me tocar outras areias,
Deixa-me à cegueira do tato,
Esquece-me como vigilante,
Deixa-me tocar, sentir e viver...

Esquece-me como aquele que só contempla
A arte que não me pertence.
Deixa-me, mesmo que seja para o nada,
Pois antes querer o nada
Do que viver da contemplação estéril
Que a mim – corpo e alma – atormenta e feri.

Oh desejo insano, deixa-me ir ao casulo,
Tentando ser outro,
Pois a insatisfação em ser você
Faz-me perder o domínio das velas
Que orientam meu velho e cansado barco.
Não quero mais ver tua arte, desejo ingrato.
Quero esconder-me de ti na não-contemplação do teu alimento.
Cego-me para não sofrer de ti.
Cego-me para não te ter nas migalhas de tuas concessões.

Abandono-me na cegueira, fujo da luz que revela tua arte,
Corro da beleza que me atormenta,
Que me faz prisioneiro da insatisfação repetida,
Insistente, presentificada numa maldade,
Numa beleza, numa encantadora e livre
Feitiçaria do desejo.

Oh desejo!
Deixa-me retornar a mim!
Deixa-me voltar à ignorância!
Deixa-me retornar ao tempo
Em que eu não sabia,
Em que eu não via!
Deixa-me ir ao momento
Onde tudo ainda não era.
‎8‎ de ‎agosto‎ de ‎2007, ‏‎09:34:40
Josemar Silva

Caras Intenções




"Cuidado com o santo que o andor é de barro!” Essa foi uma expressão que me fez lembrar Edmund Husserl (1859-1937), um dos filósofos mais importantes do século XIX. Ele é responsável pelo que hoje conhecemos como "Fenomenologia"' – corrente filosófica que reflete a velha celeuma da relação sujeito versus objeto! Uma de suas teses mais importantes, e que nos interessa, é a da “intencionalidade da consciência”. Para ele, a consciência é sempre “consciência de”, portanto, há sempre uma “intenção”. Suas contribuições ultrapassaram as muralhas acadêmicas e atingiram os sábios cérebros medievais da hierarquia eclesiástica. Nesse sentido, não só a filosofia ganhou novos argumentos, mas também a velha teologia mercantilista sobrevivente do último empreendimento conciliar. Esta velha carola ratifica a tese de que Fides et Ratio estão sempre juntas como as asas da águia, ganhando mais vôo à medida que surgem mais argumentos "filo-teológicos". Não quero com isso dizer que Husserl seja um teólogo, nem que os teólogos são filósofos, essa discussão deixo para os interessados no assunto. O que venho ressaltar é sobre a astúcia da Mater Ecclesiae: primeira instituição a praticar a globalização, não deixa de exibir suas afinidades com o capitalismo, como já evidenciava Max Weber em A ética protestante e o espírito do capitalismo – e é claro que a diferença entre católicos e protestantes está na disputa se o santo é de barro ou se o barro é santo!
Sim, e aí? O que tem a ver Husserl, a Igreja e Weber? Ah, lembrei! É que ontem fui à missa, fazia um mês que minha prima faleceu. A missa é uma oração, e se se ora, se ora por alguma causa, portanto, há uma “intenção” na oração, ou seja, na missa. Pois bem, mas alguém preside essa oração, essa missa, e sua presidência administra as “intenções” pelas quais se ora! Velha novidade: e a taxa de administração das santas “intenções”? Aí, redescobrir que para cada “intenção” se cobra uma taxa de mais ou menos dez reais. Bem, mas se você quiser que a missa seja só para sua “intenção”, aí é mais caro, custa, em média, setenta reais. Pelo que percebi, o que importa é a quantidade de “intenções” ou sua exclusividade, não sei nada sobre o critério de qualidade, ou seja, se há diferença no custo entre a boa e a má “intenção”, o que sei que importa é se é 1, 2, 3 ou única intenção; também não sei se os dizimistas têm algum desconto de 10%, se podem parcelar no cartão de crédito ou no cheque especial, mas certamente eles têm intenções!
Quando o homem descobriu que o avião serviria para guerra, Santos-Dumont ficara decepcionado. Será que Husserl ficaria decepcionado se soubesse que as “intenções” viraram mercadoria? Bem, isso não me interessa muito! Agora, se Lula, na falta da CPMF, descobrir que intenções valem de dez a setenta reais, ah, isso me interessa, porque de boas intenções o inferno está cheio!

‎1‎ de ‎fevereiro‎ de ‎2008, ‏‎22:06:21
Josemar, com más intenções!